A diabetes tipo 2 constitui um elevado factor de risco para o aparecimento da doença de Alzheimer, conclui um estudo levado a cabo por uma equipa de investigadores do Centro de Neurociências e Biologia Celular e da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (UC).
“Já havia estudos observacionais da população que indicavam que os diabéticos, principalmente os do tipo 2, apresentavam um risco mais aumentado para desenvoler doença de Alzheimer. Nós pegamos nessas evidências e fomos tentar ver se isso realmente se verificava experimentalmente”, explica Paula Moreira, coordenadora do estudo, em conversa com o «Ciência Hoje».
No estudo foram utilizados modelos animais, “ratinhos diabéticos que apresentavam alterações metabólicas típicas da diabetes tipo 2, nomeadamente o aumento da glicose no sangue (açúcar no sangue). Fomos compará-los com ratinhos que tinham sido manipulados geneticamente para desenvolver doença de Alzheimer”.
A equipa começou por fazer estudos de comportamento e verificou que ambos os grupos apresentavam alterações de memória, aprendizagem e defeitos cognitivos semelhantes àqueles que estão descritos nos doente de Alzheimer.
“Quisemos perceber o que estava na base dessa semelhança entre as duas patologias. E fomos, por isso, explorar o papel das mitocôndrias do cérebro”, refere a investigadora. Estas mitocôndrias são organelos que funcionam como fábrica de energia das células: “São elas que produzem o ATP que as células precisam para funcionarem devidamente”.
Foi verificado que, “quer nos diabéticos quer nos ratinhos com Alzheimer, estes organelos apresentavam disfunções. Produziam menos energia, menos ATP e, por outro lado, produziam mais espécies reactivas de oxigénio. Ou seja, ao mesmo tempo que havia uma deficiência energética, aumentavam os níveis de stress, tudo isto potenciando a degenerescência e a morte das células cerebrais”.
Percebeu-se também que no hipocampo e no cortex (áreas cerebrais afectadas pela doença de Alzheimer) dos ratinhos diabéticos, “apresentavam-se níveis elevados da proteína beta-amiloide, a principal componente das chamadas placas senis”. Ora, explica a investigadora, “durante a vida de um indivíduo que sofra desta doença, o diagnóstico é apenas provável; só se torna definitivo se na autópsia se observarem estas placas senis”.
Nos ratinhos diabéticos havia níveis aumentados das placas naquelas duas regiões cerebrais, o que indica que a diabete tipo 2 é um factor de risco para o desenvolvimento de Alzehimer. Este “risco aumentado” não é absolutamente quantificado, pois varia consoante muitos outros factores, mas “é significativo”.
“Isto não quer dizer que todos os diabéticos vão ter Alzheimer; o que indica é que nestes ratinhos com diabetes descontrolada (pois não lhes demos nenhum fármaco para normalizar os níveis de glicose) o risco aumentou. Obviamente, não se pode fazer este tipo de estudo em humanos e os nossos resultados têm de ser confirmados. Podemos, sim, dizer que nas nossas condições experimentais, verificou-se um risco elevado nos ratinhos diabéticos que não foram tratados”.
Importante é a prevenção
Nos últimos anos está a verificar-se um aumento descontrolado da diabetes, coisa que não acontecia há umas décadas atrás, quando esta doença “afectava apenas de indivíduos adultos”. Hoje há muitas crianças a desenvolver a diabetes tipo 2. Este aumento, considera, “deve-se a estilos de vida pouco saudáveis: dietas desequilibradas, altamente calóricas, e a um estilo de vida sedentário”.
A falta de exercício físico potencia a insulino-resistência e a diabetes. “Fazer um bocadinho de esforço para mudar as nossas dietas, ingerindo mais vegetais, mais fibras, mais fruta e fazermos mais exercício físico, como caminhar um pouco todos os dias, é já um bom ponto de partida para evitarmos o desenvolvimento da diabetes. Consequentemente, vamos prevenir as complicações que daí podem advir, como, neste caso, o Alzheimer”, conclui.